CANTAR
1. Imaterial
(Mário Fernandes, Valquírio Barcelos / Mário Fernandes, Valquírio Barcelos)
Sempre que sonhas
Tens o teu fado
Sentes que a vida é bem mais
Que um destino marcado
Sempre que sonhas
Tens a teu lado
Tudo o que noite da vida
Roubou, de sagrado
Faz a vida valer por valores
Que te valham a estrada
Faz a vida valer por amor
O resto é pouco ou nada.
Essa será sempre a certeza
Mais cedo ou mais tarde se acaba a beleza
Foge do ódio e da avareza
Tens nos teus valores a tua riqueza.
Refrão:
Imaterial, na vida... é o essencial
Imaterial, na vida... o que é especial
Atitudes audazes, tudo o que fazes
Memórias que trazes
Tornam-te imortal
O amor mais profundo, o melhor do mundo… é imaterial
Brindado e cantado, é este o meu Fado… Imaterial
Brindado e cantado, é nosso este Fado… Imaterial!
2. Fado Indignado
(Rui Rocha)
E se o meu fado fosse um fado revoltado
E não quisesse seguir mais o seu condão
Que nome dar a este fado indignado
Que quer ser fado, não quer ser outra canção
Mas este fado queria até ficar na história
E ser cantado nas vielas da cidade
Que os grandes faias o guardassem na memória
E que as guitarras lhe jurassem lealdade
Mas a vaidade nunca andou na voz do fado
Só é fadista quem lhe sente a condição
Se o mouraria não morreu e é cantado
É porque nasceu fadado
A manter a tradição
Quem sabe um dia este meu fado se arrependa
E volte a ser o que o destino lhe pediu
Pois nasceu fado e será bom que ele entenda
Se fado for é porque o fado o permitiu
Mas se na alma este meu fado não tiver
Amor, saudade, desventura e ilusão
Então eu deixo que ele seja o que quiser
Que seja um fado revoltado sem paixão
Se um coração não lacrimar quando sofrer
É como um fado que não chora amargurado
Pois se o meu fado não tem mais o que dizer
Nada vai acontecer
Vai andar sempre calado
Mas este fado mais parece ser Narciso
Quer estar na moda, ser notícia de jornal
É meio sisudo mas quer dar sempre um sorriso
Para aparecer algum evento social
Tem a certeza que um dia vai ser famoso
E não se esconde como esconde o embuçado
Nem quer saber quem foi o Conde Vimioso
Nem se a Severa alguma vez cantou o fado
Só espero que a vida nunca lhe vá dar razão
E que o menor lhe mostre como perdurou
O fado é fado nunca cede à tentação
Sabe bem dizer que não
E honra quem o cantou
E se o meu fado fosse um fado revoltado
E não quisesse seguir mais o seu condão
Que nome dar a este fado indignado
Que quer ser fado, não quer ser outra canção
3. Quando se gosta de alguém
(Amália Rodrigues / Carlos Gonçalves)
Quando se gosta de alguém
Sente-se dentro da gente
Ainda não percebi bem
Ao certo o que é que se sente
Ainda não percebi bem
Ao certo o que é que se sente
Quando alguém gosta de alguém
É de nós que não gostamos
Perde-se o sono por quem
Perdidos de amor andamos
Quando se gosta de alguém
É de nós que não gostamos
Quando alguém gosta de alguém
Anda assim como ando eu
Que não ando nada bem
Com este mal que me deu
Quando alguém gosta de alguém
Anda assim como ando eu
Quando se gosta de alguém
É como estar-se doente
Quanto mais amor se tem
Pior a gente se sente
Quando se gosta de alguém
É como estar-se doente
Quando se gosta de alguém
Como eu gosto de quem gosto
O desgosto que se tem
É desgosto que dá gosto
Quando se gosta de alguém
Como eu gosto de quem gosto
4. Não sei, meu amor...não sei!
(Tiago Torres da Silva / Casimiro Ramos - Fado Três bairros)
Não sei meu amor, não sei
Se os poemas que cantei
Algum dia foram escritos
Ao cantar cada palavra
Parecía que a inventava
Na tragédia dos meus gritos
Cantei poetas ausentes
Cantei os versos das gentes
Dos bairros com tradição
Desde alfama à madragoa
A minha voz foi Lisboa
À procura de um pregão
As palavras dos poetas
Feitas de emoções secretas
Têm que ser reveladas
E só mesmo quem as sofre
É que pode abrir o cofre
onde elas foram guardadas
Por isso é que eu te repito
Que gostava de as ter escrito
Mas sabendo que as cantei
A minha alma inquieta
Também se sente poeta
Não sei, meu amor...não sei!
5. Fadista Louco
(Alberto Janes )
Eu canto com os olhos bem fechados
Que o maestro dos meus fados
É quem lhes dá o condão
E assim não olho pra outros lados
E canto de olhos fechados
Pra olhar pro coração.
Meu coração é fadista de outras eras
Que sonha viver quimeras
Em loucura desabrida
Meu coração, se canto, quase me mata
Pois por cada vez que bata
Rouba um pouco à minha vida
E ele e eu, cá vamos sofrendo os dois
Talvez um dia, depois dele parar pouco a pouco
Talvez alguém se lembre ainda de nós
E sinta na minha voz o que sentiu este louco.
6. Lá na Senhora do Monte
(Mário Fernandes & Rogério Oliveira / Manuel Maria Rodrigues Marques - Fado marcha do Manuel Maria)
Santo António milagreiro
Hoje é o dia derradeiro
Faz com que não me amedronte
Olhai por mim nessa hora
Vou ver meu amor agora
Lá na Senhora do Monte
Lá no coração de Alfama
Faça contas de quem ama
Que não lhe importe o dinheiro
Troque os anéis pelos dedos
E assim eu largue os meus medos
Santo António milagreiro
Depois lá pelo Rossio
Faz com que não perca o pio
Ao me ajoelhar defronte
Do meu amor verdadeiro
Hoje é o dia derradeiro
Faz com que não me amedronte
Celebrar no Farta-Brutos
Cantar do Charmoso: “Os Putos”
Lá no Chico, que ela adora,
Partilhar o seu lençol
Ver em nós nascer o sol
Olhai por mim nessa hora
Santo meu, casamenteiro
Já não quero estar solteiro
Que o teu milagre se apronte
Já quase que bate a hora
Vou ver meu amor agora
Lá na Senhora do Monte
7. Gaivota
(Alexandre O´Neill / Alain Oulman)
Se uma gaivota viesse
Trazer-me o céu de Lisboa
No desenho que fizesse
Nesse céu onde o olhar
É uma asa que não voa
Esmorece e cai no mar
Que perfeito coração
No meu peito bateria
Meu amor na tua mão
Nessa mão onde cabia
Perfeito o meu coração
Se um Português marinheiro
Dos sete mares andarilho
Fosse quem sabe o primeiro
A contar-me o que inventasse
Se um olhar de novo brilho
Ao meu olhar se enlaçasse
Que perfeito coração
No meu peito bateria
Meu amor na tua mão
Nessa mão onde cabia
Perfeito o meu coração
Se ao dizer adeus à vida
As aves todas do céu
Me dessem na despedida
O teu olhar derradeiro
Esse olhar que era só teu
Amor que foste o primeiro
Que perfeito coração
Morreria no meu peito
Meu amor na tua mão
Nessa mão onde perfeito
Bateu o meu coração.
8. Meu fado meu velho amigo
(Rogério Oliveira / Mário José Lopes - Fado Lopes)
Tudo que o fado me deu
Amor loucura saudade
Minha voz lhe devolveu
Na mais profunda verdade
Quando a minha voz a medo
Se entregou ao seu dispor
E me acolheu no segredo
Do seu manto criador
O Fado não é canção
Não é cantiga ou toada
É amor vida expressão
Da alma quando agitada
Se não te ouço enlouqueço
Não te cantar é castigo
Sem ti nem me reconheço
Meu fado meu velho amigo
9. Alforria ( Rapsódia de Quintilhas do Lundum)
(Rogério Oliveira / Alfredo Duarte Marceneiro - Fado Bailado, Pedro Rodrigues - Fado Pedro Rodrigues de quintilhas, Joaquim Campo - Fado Tango)
10. Canção da Tecedeira
(Zeca Medeiros)
Quem teceu esta lonjura
Nos labirintos do mar eterno
Neste sol de pouca dura
Num sol tão breve de um longo inverno
Este cântico sombrio
Traz um queixume um desalento
É um carrossel vazio
Num lento e triste movimento
Deste mar encapelado
meu coração é prisioneiro
É um barco alucinado
que se perdeu no nevoeiro
Sempre que a noite regressa
a respirar melancolia
Vens tecer uma promessa
Urdir a tua tapeçaria
(refrão)
Vais tecendo ó tecedeira
Um segredo no tear
Um silêncio ó tecedeira
Que eu quero desvendar
À flor da terra, à flor do mar… à flor da terra, à flor do mar.
Num amor desencontrado
Canções que o tempo não esqueceu
Hás-de ser meu chão lavrado
Sei que nem tudo se perdeu
Voa, voa... garajau
Vem desenhar num golpe de asa
Resgatar a minha nau
Que naufragou na maré vaza
(refrão)
11. Longe de ti
(Tiago Torres da Silva / José Marques - Fado Triplicado)
Vi uma rua deserta
Encoberta mas aberta
Ao amor dum novo olhar
Por isso me convenci
Que era aqui longe de ti
Que eu devia vir morar
Fiz aqui a minha rua
Que foi tua, mas a Lua
Diz que não te quer cá mais
Porque não gosta de gente
Que não sente eternamente
Que as paixões são imortais
E mesmo quando termina
Numa esquina, cujo a sina
É dar cabo das paixões
A paixão fica guardada
E forçada a não ser nada
Vai minando os corações
Por isso é que não te ligo
E que digo que consigo
Viver muito bem sem ti
Mas quando me abraça o vento
É que eu lamento o momento
Em que vim morar aqui
12. Estrela da Tarde
(José Carlos Ary dos Santos / Fernando Tordo)
Era a tarde mais longa de todas as tardes
Que me acontecia
Eu esperava por ti, tu não vinhas, tardavas
e eu entardecia
Era tarde, tão tarde, que a boca,
Tardando-lhe o beijo, mordia
Quando à boca da noite surgiste na tarde
Tal rosa tardia
Quando nós nos olhámos, tardámos no beijo
Que a boca pedia
E na tarde ficámos unidos ardendo na luz
Que morria
Em nós dois nessa tarde em que tanto tardaste
O sol amanhecia
Era tarde demais para haver outra noite,
Para haver outro dia.
(Refrão)
Meu amor, meu amor
Minha estrela da tarde
Que o luar te amanheça e o meu corpo te guarde.
Meu amor, meu amor
Eu não tenho a certeza
Se tu és a alegria ou se és a tristeza.
Meu amor, meu amor
Eu não tenho a certeza.
Foi a noite mais bela de todas as noites
Que me adormeceram
Dos nocturnos silêncios que à noite
De aromas e beijos se encheram
Foi a noite em que os nossos dois corpos,
Cansados, não adormeceram
E da estrada mais linda da noite
Uma festa de fogo fizeram.
Foram noites e noites que numa só noite
Nos aconteceram
Era o dia da noite de todas as noites
Que nos precederam
Era a noite mais clara daqueles
Que à noite amando se deram
E entre os braços da noite de tanto
Se amarem, vivendo, morreram.
(Refrão)
Meu amor, meu amor
Minha estrela da tarde…!
Eu não sei, meu amor, se o que digo
É ternura, se é riso, se é pranto
É por ti que adormeço e acordo
E acordado recordo no canto
Essa tarde em que tarde surgiste
Dum triste e profundo recanto
Essa noite em que cedo nasceste despida
De mágoa e de espanto.
Meu amor, nunca é tarde nem cedo
Para quem se quer tanto!